quarta-feira, 6 de junho de 2012

COLUNA OPINIÃO

REALIDADE
Afonso de Liborni

Saí, com o Alpheu, Lair e Liondenis para conhecer a extensão do município. Assustei de ver terras férteis sem aproveitamento, montanhas, ainda cobertas de matas, testemunhas mudas de quem viu o nosso Povo sair das roças e ir para a cidade, fascinado pelo progresso. Vi finos riscos de metal cortando o céu, levando energia elétrica ao que antes era iluminado pelo sol, pela lua, pelas estrelas e pelos pirilampos.
Paramos, e, meditando no silêncio, escutamos nas capoeiras o piado triste da juriti, o soluço da rôla, o grito lúgubre do anu branco, resto da fauna rica, que ali residia outrora.
Na estrada do Mané Ricardo, vizinho do Pedro Duim e do Zé Ingracia, mais uma vez paramos para vero nosso rio Espírito Santo, tão piscoso, em seus meandros, suas voltas, seus poços fundos cheio de piaus e outros peixes agora tão sem vida.
As lágrimas emergiram ao ver a cor de suas águas, a turbidez de seus líquidos, a extinção de sua vida, pela poluição gerada em outras cidades e trazidas pela força d'água para a terra do Espírito Santo.
Outra parada, em outro ponto, e mais uma contestação do êxodo, do esquecimento. Casas abandonadas, laranjeiras e outras fruteiras carregadas, e nem uma alma viva, nem um pássaro faminto para saborear o que a terra farta e abundante dá. Só um cachorro ao longe ladrava, com a nostalgia de quem está com saudade de ver gente.
Percorremos a estrada. Muitos quilômetros. E dentro do carro em troca de olhares tristonhos pelo descuido da terra, só pensávamos nas estradas feitas pelo Alpheu, que eram muito melhores, que muitas estradas asfaltadas que existem em nossa Minas Gerais.

Da Coluna "OPINIÃO" do Jornal "Guarará", Ano 1 nº  1. Outubro de 1993
Guarará, MG


SAUDADE...
Afonso de Liborni


Passaram-se os anos, muito tempo longe, porém, nunca ausente, a saudade apertava meu peito, lágrimas emergiam, um turbilhão de ideias e pensamentos criavam em mim um frenesi, uma constante convulsão de ânsia, de vontade de ver, de abraçar, de acariciar e de sentir, o que me era e o que é querido.
Acelerava o carro, na ânsia e na expectativa de ver minha terra, a escola de minha infância, a praça de minha juventude, a vontade de reencontrar amigos. Aceleravam também os meus batimentos cardíacos, a lembrança de ver a Praça do Largo, o velho Massaud, o Toniquinho Leite, o Lindolfo Torres (*), os amigos que um dia deixei.
Cheguei no Largo, olhei a praça e o jardim, lembrei de minha primeira namorada, revi os majestosos casarões de outrora, que resistira mau tempo e que fizeram a história. Eu estava novamente na minha Guarará.
Apertou no meu peito uma angústia, na minha garganta um embaraço, e o meu corpo era uma só saudade. Quanto tempo! Onde estariam os amigos de escola e de pescaria? Onde estava o bar do Calixto, a venda do Massaud. Vi que o progresso havia chegado, e com ele algumas mudanças inexoráveis, mas o ar, este estava como outrora, cheio de um aroma gostoso de café sendo torrado. Era uma fumaça que não poluía, de um cheiro que enebria, e que mais uma vez me fez lembrar o cafezinho servido na caneca de esmalte, no sítio do meu amigo Hugo Menegueli.
Meus olhos esquadrejavam cada lugar, todos os cantos, percorriam a praça e os morros sulcados por antigas plantações de café, mas novamente entristece,baixei os olhos, limpando novas lágrimas, porque não vi nenhuma plantação nesta terra tão rica.
Vi alguns jovens, bonitos, sorridentes e simpáticos. Aproximei-me, fiz algumas perguntas, fiquei sabendo de algumas novidades, e percebi que aqueles jovens não possuíam um lugar para trabalhar, e mais uma vez, a impiedosa sentença da consciência, como um algo do meu próprio eu, mostrou-me que havia envelhecido longe de minha terra, dos meus amigos, de minha gente, e o pior, o que fiz quando no meu exílio voluntário para auxiliar aqueles que me eram caros.
O doce hálito do ar fresco e perfumado misturaram com o sal de minhas lágrimas, e saí na direção do sítio do compadre José Rocha, lá na Forquilha. Nenhuma plantação, poucos gados. De bom só uma estrada larga, bem cuidada que me informaram que foi o Alpheu quem tinha feito. No Salomão vi uma ponte nova, construída pelo Antônio, filho do meu amigo Vaval, que soube com tristeza que também já tinha partido definitivamente.
Reencontrei minha terra, e achei a saudade. Pensei em rever amigos, mas a maioria já tinha partido. No bucolismo de sua arquitetura centenária, tirei algumas fotos para minha recordação, e agora escrevo uma saudade, na esperança e na tentativa de reviver o meu passado, tão caro e tão amado. Da saudade, resta-me uma esperança, de que um dia voltarei, e ficarei definitivamente, nesta minha terra de esperança e de saudades...

Da Coluna "OPINIÃO" do Jornal "Guarará", Ano 1 nº  2. Novembro de 1993
Guarará, MG
(*) OBS: Lindolfo Torres era casado com dona Laura Cândida Torres.

AS ESTRELAS SÃO DEUS?
Afonso de Liborni

— Mamãe, as estrelas são Deus? Perguntou curiosamente o menino de olhos vivos e inteligente.

— Não! Solicitamente e imediatamente respondeu a mãe.

E o menino, com o olhar atento de quem procurava uma resposta, de quem quer desvendar um mistério, tornou a perguntar: — Mas Deus não mora no céu? E as estrelas também não moram lá?
E a mãe, ocupada com seus trabalhos, parou e viu naqueles olhinhos, um questionamento causado por uma grande dúvida, e sentando ao seu lado, indagou-lhe o porque daquela afirmação. E menino cheio de dúvidas, como quem está com medo de falar ou de questionar, completou a sua dúvida, dizendo: — Quando a gente fala com Deus, a gente não olha para cima, lá para onde as estrelas moram? Quando a gente precisa de Deus, nós ficamos com olhos no céu, procurando naquele infinito, uma resposta ou sinal de Deus, e quando encontramos um ponto luminoso, a gente imagina Deus, e concentra o pensamento, elevando uma prece sentida e silenciosa, como se aquele ponto de luz no infinito fosse Ele presente!

A mãe atentamente percebeu a confusão de fé que campeava os pensamentos daquela criança e, sentando ao seu lado, trazendo carinhosamente ao encontro de seu corpo, tentou explicar o que era uma estrela e o que era Deus.
Foi quando ele deixou uma lágrima escorrer na face, fruto de um soluço da alma, como quem descobre que aquela estrela grande e bonita, forte, cheia de luz, que ele namorava todas as noites e que vinha sempre em sua mente e em suas orações, que aparecia até no presépio, não era o Deus que ele havia encontrado.



COITADA DA NOSSA LÍNGUA
Afonso de Liborni

Nossa geração mais antiga, mais madura, mais experiente, e que já viveu alguns anos a mais, está assistindo passivamente a morte de nossa Língua Pátria.
Antigamente, quando se lia um jornal, se encontrava palavras pomposas, com adjetivos e muitos verbos, mostrando a abundância e a riqueza da língua portuguesa.
Ao referir-se a uma senhora, os jornais de outrora usavam termos como: "Senhora de acrisoladas virtudes", mas, hoje, a americanização do nosso idioma assola a nossa literatura, e entremediar palavras de origem inglesa tornou-se cultural (cult, no escrito moderno) e, ao abrir uma página, encontra-se várias expressões, como in, out, marketing, etc.
Isto é retornar à condição de vassalo, é receber os grilhões da escravatura, sem um grito de independência. É aceitar passivamente a dominação cultural, início de uma dominação total, é interferir na soberania, sem uso de armas ou aparatos militares.
Da minha querida e pequenina Guarará, parte do meu ictus cordis, lanço este grito de alerta contra a literatura, as músicas, a televisão americana, que invadem nossos lares, fazendo propagandas subliminares, alienígenas, deturpando a nossa cultura.
De lá queremos tecnologia de 1º mundo, e não a avalanche do consumismo desenfreado, que traz chicletes e leva minério, que traz enlatados e carrega riquezas.
Somos brasileiros e guararenses, e queremos dar ao Brasil a consciência desta invasão sutil, que aniquila nossos valores, mata nosso idioma e impõe uma língua de conhecimento de poucos.
A você, meu matuto mineirão, desconfiado mas sério, com seu linguajar verdadeiramente nosso, participe desta ideia, e façamos juntos um Brasil bem brasileiro.

Da Coluna "OPINIÃO" do Jornal "Guarará", Ano 1 nº 3. Dezembro de 1993
Guarará, MG

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